Olá minhas amigas e meus amigos, hoje eu
mostro a vocês mais um Conto de minha autoria. Vamos a ele e espero que
gostem.
Meados de agosto de 1932, – Revolução Constitucionalista; estamos
no sul do Estado de São Paulo, mais precisamente, na divisa com o Paraná, onde
as tropas paulista, em combates sangrentos, defendiam heroicamente o Estado
contra a invasão das tropas do governo, mormente na região de Itararé,
entretanto, foi na cidade de Buri, até então uma pequena cidade, onde tudo aconteceu.
Cidade para a qual, foi destacado um pequeno contingente, – um
pelotão do exército paulista – com o objetivo de defender a cidade, garantindo
assim a segurança e a tranquilidade da população.
Na primeira semana que os soldados por lá estavam, era tudo tão
calmo que nem parecia que havia revolução, – não se ouvia um tiro sequer;
parecia até bobagem e desnecessário que os soldados ficassem agrupados, aqui e
ali, atrás de pilhas de sacos de areia na praça central da cidade.
Todavia, na segunda semana a coisa começou ficar estranha e muito
estranha.
Quase todos os dias a partir daquela semana, logo bem cedo, das
seis horas da manhã quando os sinos da capela tocavam e até uma hora depois, o
pânico era geral entre os soldados, pois tiros intermitentes, – dois ou três no
máximo, a espaços regulares e preciosos, faziam cair por terra ou ferir os
soldados... O pior era que ninguém sabia e nem via de onde os tiros partiam...
O mais curioso, era que depois disso, – depois desse horário, tudo
voltava a ficar calmo e não acontecia mais nada, entretanto, era o suficiente
para pôr a tropa de sobressalto deixando todos muito assustados, receosos,
cheios de temor, e Albano – um jovem soldado raso, não era exceção.
Quando o dia começava amanhecer, com o sol nem bem dando às caras,
só se via soldados, começando pelo sargento, se escondendo por todo lado com
medo de ser atingido.
E assim foi, dia após dia, com os soldados sendo atingidos aqui e
ali, deixando todos, sem exceção, atônitos feito “barata tonta”, completamente
perdidos, em polvorosa, apavorados e extremamente temerosos; era notório o
pânico estampado no rosto dos soldados.
No início da terceira semana, depois de um soldado ser atingido e
morto, Albano, religioso como era, acompanhou, junto com outros, o padre da
cidade fazer o ritual de sepultamento. Depois da cerimônia, Albano tremia como
vara verde de tanto medo. E de tão temeroso, cheio de pavor, mesmo o padre
sendo gaucho de origem, confiou e falou com o padre.
— Padre, eu estou com medo... Não quero levar nenhum um tiro não!
Por favor, me ajuda padre... O que faço?
O padre ouviu sua súplica e ficou, por momentos, lhe olhando...,
olhando..., em seguida, lhe pôs a mão no ombro e falou, parecendo muito seguro
de si, com voz pausada e até confortante:
— Filho..., nada irá acontecer com você, fique tranquilo!...
Ficar tranquilo? Aquilo parecia ironia, nada além; inseguro e
temeroso, – tremendo de pavor, como ficar tranquilo? O que o padre queria dizer
com aquilo? De que nada iria acontecer com ele. Incrédulo, apesar de muito
jovem e respeitar o sacerdote mesmo sem conhecer, perguntou aos risos de forma
até atrevida, – como se duvidasse do padre.
— Como padre?... Estou aflito e o senhor fala como se nada irá me
acontecer. O que lhe dá essa certeza?
O padre ficou ainda lhe olhando, em seguida, dando a clara
impressão de estar já sem paciência, como muita naturalidade, lhe disse:
— Se estou dizendo que não vai lhe acontecer nada, não vai! Confie
em mim!
— Tá bom, padre! – disse Albano. O senhor falando assim, eu vou
acreditar!
— Isso, filho! Creia em mim! Agora deixa eu ir, tenho coisas pra
fazer. Tchau!
— Tchau, padre! – despediu e ficou observando o padre sair do
cemitério e, ao mesmo tempo, pensando.
“Que caramba esse padre falou?... Por que ele tanta certeza assim?”
Daquele dia em diante, desconfiado e muito inseguro – apesar das
palavras do padre, Albano ficou de olho nele; aonde o padre ia, ele acompanhava
com os olhos. Com isso, quase no final da terceira semana, ele notou algo
estranho: depois de ver o padre passar pelo meio praça indo à capela tocar o
sino, coincidência ou não, os tiros aconteceram.
Na dúvida, guardou aquilo com ele e não falou pra ninguém, também
pudera, como ia dizer que estava desconfiado do padre? Não dava mesmo! Nem ele
acreditava que aquilo fosse possível, mesmo o padre sendo um gaucho, era um
religioso e não iria jamais fazer um negócio daqueles, – era o que ele pensava.
No dia seguinte, nem bem havia amanhecido, Albano já estava de
prontidão. Quando viu o padre passar pela praça indo à capela, ficou de olho
pregado espreitando atento... Logo a seguir, com o padre entrando na capela, de
onde estava, ele viu e ouviu os sinos badalarem anunciando às seis horas.
Quando os sinos pararam de tocar, Albano divisou no parapeito da
janela da torre da capela o cano de uma arma. Surpreso, se ajeitou o melhor que
pôde para poder observar quem estava camuflado e constatou: era o padre com um
fuzil na mão já fazendo pontaria.
Naquele exato instante, religioso, jovem, soldado raso ou não,
Albano não titubeou e nem perdeu tempo. Houve um tiro sim! Um tiro certeiro,
por sinal! Só que partiu do fuzil de Albano pondo fim àquele mistério.
J.R.Viviani
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