EPÍLOGO DO:
No Domingo, depois da missa, falaram com o padre
para marcar o casamento. Naquela época, no Barreiro, era o Padre Abílio que
estava na Igreja de Sta. Cruz onde eles acabaram por casar.
Este, depois de ter ouvido a confissão dos dois,
fez questão de tratar de tudo rapidamente e sem qualquer custo. Casaram três
semanas depois, o tempo necessário para os proclamas na terra dos noivos.
João tinha alugado uma casita num pátio perto da
entrada da Seca. Era pequena, apenas um quarto e uma cozinha, uma pequena
arrecadação e um galinheiro nas traseiras. Não tinha luz elétrica, nem água
canalizada. Mas, no centro do pátio, havia um poço com uma espécie de tripé por
cima, com uma roldana, onde passava uma corda que tinha numa das pontas um
balde. Era desse modo que eles se abasteciam de água. Não tinha casa de banho.
As necessidades faziam numa espécie de pote em argila, que era despejada todas
as manhãs na “pipa”, A “pipa” era uma camioneta cisterna, propriedade da
Câmara, que todas as manhãs percorria os pátios para recolher os detritos. Num
canto do pátio, havia um pequeno cubículo onde se improvisara um duche
comunitário, já que servia para todos os moradores do pátio, que era composto
por oito casas. O duche era a ponta de um regador, presa num tubo que saia de
um bidão que alguém instalara lá em cima. Estava sempre cheio de água. Cada vez
que alguém tomava banho, quando acabava, ia ao poço buscar água para voltar a
encher o bidão. De Verão, o bidão apanhava sol todo o dia e o banho era quente.
De Inverno, era gelado, claro. Naquelas três semanas, até ao casamento,
compraram uma cama, uma mesa e dois bancos. A madrinha de casamento, deu-lhes
dois lençóis e o padrinho, uma máquina a petróleo para fazer a comida. A cunhada
deu-lhe meia dúzia de pratos e dos futuros vizinhos recebeu um tacho, uma
panela, uma sertã, um candeeiro a petróleo e uma manta de trapos.
Rosa fora
trabalhar para a Seca do Bacalhau e lá encontrou gente da sua aldeia e de certa
maneira sentiu-se mais segura. Era gente que trabalhava muito, ganhava pouco e
ainda tinha que poupar para a viagem de regresso à aldeia, quando a safra
acabava, e também para os meses que ficavam lá na aldeia, sem saber onde
arranjar dinheiro para comer. Mesmo assim, juntaram-se e compraram o vestido de
noiva da Rosa. Era uma saia azul e um casaquinho da mesma cor e uma blusa
branca. A cunhada deu-lhe os sapatos. Não eram novos, tinha sido a madrinha
dela que lhos dera no casamento. Mas como estavam apertados só os usara nesse
dia. Eram pretos, com um vivo largo branco a toda a volta.
Quando no dia do casamento, se viu ao espelho, Rosa
achou-se uma rainha. E lá foi para a igreja, na carroça do ti’ Abel com o
futuro marido, porque essa história do noivo não ver a noiva antes do
casamento, não era para gente pobre. Pelo menos nessa época.
No ano seguinte, Rosa dava à luz uma menina e no
outro, mais uma menina e no outro ainda, um rapaz.
Três filhos em três anos. João trabalhava agora na
C.U.F., ganhava um pouco melhor mas, ainda assim, pouquíssimo para as
necessidades de cinco bocas. A casa também não tinha condições. No quarto, além
da cama de casal e do armário, só cabia o berço. As duas crianças mais
velhinhas dormiam no chão da cozinha, numa cama feita com uma manta de trapos.
Quando vagou uma casa de dois quartos no pátio,
mudaram-se para lá. Mas Rosa já estava outra vez grávida. Nessa altura não
havia pílula, só as “camisinhas”. Mas João não as queria usar. Quando os amigos
ou vizinhos comentavam da pobre Rosa que sofria de “prenhez crónica” ele dizia
a rir:
― E o que é que eu hei-de fazer? O raio da mulher basta olhar para mim
quando estou a mudar de roupa para “embuchar” logo.
Rosa adorava o marido. Nunca lhe batera, o que os
maridos das vizinhas faziam com frequência, nunca a ofendera e, às vezes, até
era carinhoso com ela. Era bom pai, muito trabalhador, não se metia nos copos
como alguns vizinhos. O pior era não querer usar a malfadada “camisinha”. Cada
vez que ela lhe pedia, respondia sempre que "os rebuçados embrulhados não
sabem a nada". E Rosa começava a estar cansada.
Felizmente para ela, o bebé não foi além do
terceiro mês, tendo sofrido um aborto espontâneo. O pior foi que pelo Natal já
estava outra vez grávida. Rosa tinha que aproveitar o trabalho na Seca do
bacalhau para ajudar a despesa da casa. Levantava as crianças logo de
manhãzinha e lá ia ela para o trabalho, com um filho no bucho, os dois mais
pequenos sentados cada um do seu lado sobre a anca e a maiorzinha agarrada às
saias. Na Seca, estendia o xaile dentro dum carro de mão e lá metia os bebés
guardados pela pequenita enquanto ela trabalhava. Tempo depois, voltou a
abortar e deu Graças a Deus por isso.
Depois, vieram mais três em quarenta meses. Rosa
ainda não fizera 28 anos e já tivera seis filhos e dois abortos. As duas filhas
mais velhas já estavam na escola. Rosa tinha vergonha de mandar as crianças,
para a escola, com os sapatos rotos mas não podia comprar outros. De roupa, as
duas mais velhas estavam servidas. Havia na Seca uma senhora, esposa do chefe
de escritório, que tinha duas filhas, um pouco mais velhas que as suas e
dava-lhes a roupa que já não servia às meninas. Coisas caras, de bons tecidos,
que mesmo depois de deixarem de servir às filhas, ela guardava religiosamente
para a mais pequenina. Para os rapazinhos é que era pior. Mas a necessidade
aguça o engenho e Rosa ia aproveitando das suas roupas e do marido, que já não
davam para consertar, alguns bocados bons que dava para uns calções ou um bibe
para os miúdos. De quando em vez, Amélia, a cunhada, lá arranjava maneira de
lhe dar um quilo de arroz, umas batatas ou meio litro de azeite. Não muito que
também ela vivia com muitas dificuldades. O problema dos pobres é que o que
podem partilhar é sempre muito menos do que manda o seu desejo de ajudar.
À noite, quando regressava do trabalho, Rosa
recolhia do pessoal que vivia na Seca e cuja cozinha era composta por enormes
fogões a lenha, o carvão que os ia aquecer na braseira.
Mas sentia-se muito cansada. Sentia-se velha. A
vida estava cada dia mais difícil. O ordenado do marido não chegava para nada.
O dono da mercearia fiava-lhe o avio durante a semana. Quando no Sábado o
marido recebia a semanada, passava por lá para acertar contas e vinha logo sem
dinheiro para casa.
De setembro a março, Rosa trabalhava na Seca do
bacalhau. Trabalho duro e não muito certo pois, quando o Inverno era rigoroso e
não se podia pôr o bacalhau na rua para secar, não havia trabalho. Às vezes,
ficava-se uma semana inteira sem ganhar um tostão. Mas, ainda assim, vivia-se
melhor que de Verão, pois sempre eram dois a ganhar. E depois era a oportunidade
dela ver gente da sua aldeia e de outras vizinhas, de rir, cantar e esquecer um
pouco a miséria que tinha em casa. Ali, naquele mundo maioritariamente
feminino, não havia segredos. Todas sabiam quando alguma levava “porrada” do
marido, quando não tinham que comer ou quando punham “um filho a estudar”. Pôr
um filho a estudar, para aquelas mulheres, era fazer um aborto. Muitas faziam –
nos elas próprias sem quaisquer condições. Por causa disso, não raras vezes,
alguma morria com uma infeção. Algumas, trabalhavam na seca com os maridos,
outras, os maridos trabalhavam nas fábricas de cortiça, ou na C.U.F. mas todas
viviam irmanadas na mesma vida difícil e contudo aparentavam uma alegria
difícil de explicar, pois passavam as horas de trabalho sempre cantando ou
contando anedotas como se o trabalho fosse leve e a vida lhes sorrisse lá fora.
Algumas faziam graça com a própria fome, como a Rosalina, que enfiava um dedo
no meio do pão e comia à roda do dedo, dizendo que comia pão com chouriço, ou a
Virgínia que dizia estar a almoçar um cozido à portuguesa, enquanto emborcava
uma sopa deslavada.
Por esses dias, a Ti Urbana perguntou-lhe:
― Ó Rosa, tu já estás prenha outra vez, mulher?
― Não! - A resposta foi quase um grito. Pela sua saúde, não me diga isso
que me desgraça.
― Eu não te digo mas que estás é verdade. Basta olhar as tuas pernas. Ó
mulher mas tu não tens juízo?
― Ai Ti ‘Urbana, se for verdade, tenho que dar um jeito. Não quero ter
mais filhos. O meu Alberto ainda não fez os sete meses.
― Vai ao posto médico. Mas olha que eu nestas coisas nunca me engano.
Na Seca, havia um posto médico, com um enfermeiro,
e às quintas-feiras ia lá um médico.
Nessa semana, Rosa foi ao médico que o confirmou.
Mais uma vez estava grávida!
Pediu ajuda a algumas mulheres mais velhas. Nunca
fizera um aborto mas, desta vez, tinha que ser. Estava decidida a não ter mais
filhos. Mas não tinha dinheiro para ir à parteira. A Adélia ensinou-lhe a fazer
escalda-pés com grãos de mostarda. Fez durante 3 dias mas não resultou. Depois
foi fazendo tudo o que as outras lhe diziam já ter feito até terminar por picar
o útero com um talo de aipo até sangrar. "Resulta sempre", tinham-lhe
dito. E resultou. Numa grande hemorragia, seguida de infeção, que a levou à
sala de cirurgia e nunca mais pôde engravidar.
Quando Rosa saiu do hospital, o padre que a tinha
casado, arranjou-lhes um dos oito fogos, que ele próprio mandara construir para
alguns dos seus paroquianos, que viviam em condições miseráveis. A casa ficava
na vila, longe portanto da Seca, mas Rosa achou que lhes tinha saído a sorte
grande. A casa, composta por uma boa cozinha, casa de banho e três quartos, com chão de tacos, pareceu-lhes
um palácio. A vida do casal começava a melhorar. A filha mais velha foi servir
para Cascais e só vinha a casa uma vez por mês. A segunda também foi servir
para casa dum Sr. Doutor, lá mesmo no Barreiro. Dos três mais velhos, ficava em
casa o rapaz que era muito frágil e que tinha sempre “uma ninhada de gatos no
peito”. Ali na vila, já havia algumas senhoras que lhe davam umas horas de
trabalho para limpezas ou passar a ferro e a vida parecia então começar a
equilibrar-se. Mas… foi nessa altura que João mudou. Andava macambúzio, perdera
parte da sua alegria, olhava à volta com desconfiança e, de vez em quando, saía
à noite. Às vezes, vinha cedo mas outras, só voltava de madrugada. Rosa começou
a pensar que ele tinha arranjado uma amante.
Sentia que o chão lhe fugia debaixo dos pés e um
dia fez-lhe a pergunta direta.
João irritou-se. Que ela estava doida, onde teria
ido buscar essa ideia. Mas Rosa não ficou convencida. E uma noite, em que o
marido voltou a sair, ela foi atrás dele. E viu quando ele se encontrou com
mais dois e como andavam acautelando-se nas sombras. E viu quando um quarto
homem chegou com uma pasta, da qual tirou uns papéis que distribuiu em
silêncio. Escondida, viu como os homens espalhavam alguns papéis, protegendo-se
sempre no escuro e sem trocarem uma palavra. Assustada, voltou para casa e
meteu-se na cama. A tremer, esperou a chegada do marido. Ela já tinha visto
alguns papéis daqueles no chão. Tentara até apanhar um mas a vizinha impediu-a.
Disse-lhe que eram papéis contra o governo, que os comunistas espalharam, mas
que se ela fosse apanhada com algum, seria considerada comunista e seria presa.
Preso!? O João podia ser preso? A frase martelava-lhe a cabeça e dava-lhe
suores frios.
Quando João chegou a casa, achou a mulher estranha.
― O que tens, mulher? Aconteceu alguma coisa?
Ela respondeu com outra pergunta:
― Tu és comunista, João?
― Cala-te, disse perdendo a cor. Nem em pensamento, ouviste, nem em
pensamento repitas isso.
― Então é verdade, disse ela com a voz embargada pelas lágrimas. Mas
porquê? Já passámos tanta fome, tanta miséria e agora que a nossa vida está bem
melhor, é que queres desgraçar-nos.
― Tu não compreendes mulher. É nosso dever tentar que os nossos filhos
não passem o que nós passámos.
― Mas… e se eles te prendem João?
― Não te preocupes, nós temos cuidado. É verdade que há muitos “bufos”,
mas também há muita gente do nosso lado.
Mas, desde aquela noite, e durante vários anos,
Rosa nunca mais teve um minuto de sossego.
Quando em 1969, a filha mais velha da Rosa se
casou, ela já não sabia do marido há largos meses.
Mergulhado nos ideais comunistas, João fora-se
embrenhando na política e tornando-se um membro muito ativo. A política é uma
amante muito ciosa dos seus afetos e não tem contemplações com outros amores,
especialmente em regimes fascistas e repressivos. Assim, aos poucos foi-se
afastando cada vez mais da família. No começo, ele conseguia conjugar o seu
trabalho, a vida familiar e as obrigações do partido sem levantar grandes suspeitas.
Mas à medida que se foi tornando mais influente dentro do partido, isso
tornou-se praticamente impossível. E quando, após uma denúncia, a maior parte
dos seus camaradas foram surpreendidos e presos, João, que só não fora à
reunião porque nesse dia entrara às 16 horas no trabalho e só saiu à
meia-noite, pensou que a sua prisão estaria por horas. Em parte por causa da
família, e em parte porque achava que seria mais útil ao partido cá fora do que
preso, fugiu nessa mesma noite. Mais uma vez, Rosa ficava numa situação
precária, com 3 crianças e um adolescente frágil e doente para cuidar e
alimentar. Valeram-lhe as duas filhas mais velhas e algumas vizinhas. Estas ajudavam
não só com alguma comida como também arranjando-lhe mais horas de trabalho,
para ela ganhar algum dinheiro. De vez em quando, chegava uma carta com algum
dinheiro. Não muito mas era uma ajuda. Embora as cartas não trouxessem
remetente, Rosa sabia que eram do marido. A primeira carta chegou com carimbo
de Beja, a segunda de Lisboa, a terceira de Faro. Cada uma de um sítio
diferente. Ela não podia saber que a carta que recebia viajava sempre com algum
camarada para uma terra distante e só lá era metida no correio. Mas este era um
estratagema que eles usavam para despistar a PIDE. Agora, a filha mais velha ia
casar. Rafael era um excelente rapaz, muito trabalhador. Filho único, de mãe
viúva, conseguiu livrar-se da ida para o Ultramar, por ser dado como amparo de
mãe.
Rosa sentia uma grande tristeza por não ser o
marido a levar a filha ao altar e não tê-lo a seu lado naquele dia tão
importante das suas vidas. Afinal, a noiva era a sua menina. Tinha medo que ele
estivesse preso. Há vários meses que, não recebia nenhuma carta. Falava-se em
sussurros que nas últimas semanas tinham sido efetuadas muitas prisões. De vez
em quando, desaparecia um vizinho. No Barreiro, havia muitas mulheres como ela.
Viúvas da política. Algumas eram viúvas de facto pois os seus maridos foram
torturados até à morte. Outras eram viúvas de maridos vivos, pois que estes
estavam presos e muitas vezes nem a família sabia onde, ou ainda, andavam
fugidos por terras estranhas.
Naquela manhã do dia 25 de Abril de 74, Rosa
olhava-se no espelho e não se reconhecia. Apesar de não ter ainda 50 anos, Rosa
estava cada dia mais velha, a face enrugada, os cabelos embranquecidos, o corpo
magro e alquebrado, resultado de ser toda a vida saco de pancada da vida.
Pensava que já não tinha forças para se aguentar muito mais tempo. A sua
família tinha-se desagregado.
Do marido, não sabia há muito, talvez estivesse
preso, ou, quem sabe, tivesse morrido em qualquer prisão. As filhas casaram e
embora não vivessem longe, estavam cada dia mais desligadas da casa materna,
divididas entre o trabalho, o cuidarem da casa e dos filhos.
Dos dois rapazes mais novos, um conseguiu realizar
o sonho de ser fuzileiro e encontrava-se num destacamento no Lungué-Bungo, no
leste de Angola, enchendo de saudade e preocupação o seu coração de mãe. O
outro, que era contra a guerra, fugira de salto para a França. Restava-lhe em
casa um filho, cada dia mais doente, e uma filha adolescente.
Sacudiu a cabeça, como se quisesse abandonar todos
os seus pesares, e dirigiu-se a casa do Sr. Doutor, onde ultimamente trabalhava
a dias, sem sequer sonhar que no seu País estalara uma revolução que ia mudar
toda a sua vida. Ela não sabia mas a sua família não era muito diferente da
maioria das famílias portuguesas pois, nessa altura, o País via-se sangrado da
sua juventude. Uns partiam para as colónias e nunca se sabia se voltavam ou
ficavam por lá vítimas de uma mina ou de alguma bala emboscada. Outros fugiam
para não partirem para uma guerra que não queriam nem entendiam.
Foi com surpresa e medo que Rosa ouviu da boca da
patroa, a notícia da Revolução. Medo porque a "doutora"- era assim
que ela gostava de ser tratada, embora o médico fosse o marido - lhe deu a
entender que a revolução era muito má para o País e para eles, patrões, que
talvez não pudessem continuar a dar-lhe trabalho. Rosa ficou muito preocupada.
Se ficasse sem trabalho, como ia pôr comida na mesa? Mas quando chegou a casa,
o filho explicou-lhe o que significava a revolução de uma maneira diferente.
Falou-lhe do fim da guerra colonial, da abertura das prisões, do fim da PIDE e
do sonho dum País mais igualitário.
No dia seguinte à tarde, quando Rosa chegou a casa,
teve uma grande surpresa ao encontrar o seu João. Muito magro, o cabelo todo
branco e o ar macilento, em nada se parecia com o homem com quem casara. Apenas
o brilho no olhar, lhe lembrava o João de antigamente. Apesar da alegria do
reencontro, Rosa estava preocupada com a saúde do marido, que recuperava aos
poucos as mazelas físicas, mas as psicológicas continuavam a persegui-lo.
Dias depois, Rosa e João comemoravam pela primeira
vez na sua vida o 1º de Maio. E dois meses depois, podiam abraçar o filho
António, que regressara da França, ao saber que o novo governo estava a
negociar a independência das colónias e que, por isso, não teria que ir para a
guerra.
Para
Rosa tudo era novo e diferente, ela não entendia muito bem o que se passava no
País mas o que ela notava é que o povo estava mais alegre, mais feliz
Por
outro lado, João recuperara o emprego, o filho conseguira trabalho na
Siderurgia Nacional, a filha mais nova fora trabalhar para a Timex, até o filho
doente, estava melhor agora, graças a uma bomba que o médico já tinha receitado
à muito, mas que ela nunca conseguira comprar. A sua vida estava muito melhor,
ela podia enfim descansar um pouco, deixando o trabalho a dias e ficando em
casa a cuidar do marido e dos filhos solteiros. Podia também cuidar dos netos,
deixando as filhas mais descansadas e mais libertas de despesas. Porém, sobre
ela pairava, como uma sombra, o medo pelo filho ainda lá longe. Principalmente
porque não havendo a P.I.D.E, nem censura, tudo o que se passava em África
chegava a Portugal. Rosa sabia que o governo, estava a negociar a
independência, mas todos os dias chegavam a Portugal “os retornados” que
falavam do medo que sentiam, da guerrilha entre os movimentos de independência,
e os residentes pró colonialistas, que grassavam por todas as colonias, do
recolher obrigatório, da incapacidade dos militares impedirem os indígenas que
os saqueavam. E o seu filho continuava lá em Angola. Por outro lado, os
políticos pareciam não se entender, os governos provisórios sucediam-se, e Rosa
tinha muito medo que tudo voltasse ao mesmo, ou como diziam alguns, que a
seguir à ditadura fascista, se seguiria uma ditadura comunista. O marido
dizia-lhe que isso sim seria um sonho, mas Rosa que era uma mulher sem
instrução, e tudo o que aprendera na vida, ficara-lhe gravado na memória
pelo sofrimento, achava que ditadura nunca seria coisa boa, fosse ela fascista
ou comunista. E lembrava-se do que a avó sempre dizia quando ela era pequena e
nem bem sabia o sentido das palavras. “Atrás de mim virá, quem bom me fará”
Tinha medo. Muito medo de ainda vir a achar que os anos para trás, é que tinham
sido bons. Naquele verão, mais de um ano após a revolução, o país parecia
caminhar para uma guerra civil, e Rosa tinha muito medo do futuro. Medo que só
perdeu, quando em Novembro de 75, pôde enfim abraçar o filho que regressara são
e salvo, após a Independência de Angola. E quase no final desse mesmo mês, a
viragem histórica do país, que afastou o espectro da guerra civil.
Agora
sim, Rosa era uma mulher feliz.
Maria
Elvira Carvalho
* * *
Não
deixem de visitar o site da autora clicando AQUI, onde, eu tenho certeza, irão
se deslumbrar...
* * *
Espero
que tenham gostado da divulgação. Um abraço a todos e até a próxima!
______________________________________
12 comentários:
Como sempre, a narrativa da Elvira é cativante, prende-nos a atenção e ao mesmo tempo nutre-nos com fatos históricos. Não poderia deixar de prestigiá-la nesse espaço de trocas e novidades literárias.
Grande abraço e Feliz Natal ao amigo.
Não há dúvida que Elvira tem imenso talento narrativo.
xx
Elvira, você escreve muito bem e sabe nos prender ao seu texto!
Bjus e FELIZ NATAL,amiga!
http://www.elianedelacerda.com
~ Uma narrativa bem estruturada e realista que retrata uma época muito dura para os trabalhadores. ~
~Paz~Saúde~Amor~Fraternidade~Luz~
~ ~ ~ Dias felizes. ~ ~ ~
Vim agradecer amigo Viviani este belo trabalho de divulgação do meu conto. E se me dá licença aproveito o seu espaço para agradecer a todos os que leram e comentaram o conto.
Um Bem Haja para todos vós.
E um Natal com muita saúde e alegria.
¡Hola J-R!!!
Vaya relato precioso y completo, hay que ver cuantas calamidades pasó la pobre Rosa. Pero al final fue feliz. Eso es lo que importa.
Pero hoy quiero dejarte mi cálido y fuerte abrazo, mi gratitud y mi estima siempre.
Felices fiestas desde mi corazón. Que el nuevo año te colme de salud, amor, paz e inmensa felicidad para ti y los tuyos.
Besos azules en vuelo.
Me olvidaba, Felicidades a Elvira.
A Natale tutti ritorniamo bambini! Allora ti auguro che la gioia, la pace e l'allegria, possano accompagnarti per tutti i giorni dell'anno. Buon Natale.
OLá Viviani
Volto.. para desejar Um Feliz Natal com muita saude, paz e amor e que 2015 todos os sonhos sejam realizados.
Um beijinho
Teresa
Venho desejar a Viviani e a todos os autores homenegiados um Feliz Natal e um excelente 2015, com tudo de bom, quer a nível literário, como em todos os aspectos da vida!
Uma abraço!
Amigo Viviane.
Parabéns pela belíssima divulgação
obrigada por seu carinho e amizade.
Um Santo Natal.
Um ano novo na paz de Jesus.
Evanir.
A riqueza de detalhes, faz a gente entrar na história....parabéns a autora.
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